A Suíça e os costumes

Depois de um ano e dois meses morando aqui, e hoje que é 7 de Setembro (...), acho que já dá pra escrever este post. Depois de ver e viver tanta coisa nova e diferente, me acostumar com umas, com outras não e renunciar alguns dos meus antigos costumes, aproveito pra compartilhar aqui alguns fatos.

Assim que cheguei aqui, tudo era novidade e até eu reparar a recorrência de alguns fatos, demorou um pouco pra assimilar a realidade. Até você perceber que é normal tirar os sapatos ao chegar na casa de alguém e que não é nada de outro mundo assoar o nariz fazendo maior barulhão seja no trem, numa reunião ou numa festa, você olha pros lados e se pergunta se só você acha aquilo diferente. Se a resposta for sim, é porque é um costume do meio em que estás, e mais cedo ou mais tarde, você há de escolher se vai ceder ou resistir a ele.

O que ainda não me acostumei na Suíça

Por mais que já tenham me dito que é normal, e não é só aqui, eu não consigo me acostumar a tomar sopa no almoço. Faça sol ou frio (ou neve), é sempre uma opção de entrada no almoço, e eu simplesmente não consigo. Sopa pra mim sempre fez parte da janta. Não combina tomar sopa e depois almoçar, ne.

Outra coisa é jogar papel no vaso. Também não me acostumo. Já me disseram que é mais higiênico porque não junta sujeira no seu lixeiro no banheiro e não fede, mas pra mim, isso se resolve trocando constantemente o saco e limpando o lixo do banheiro. Tenho sempre a impressão que jogando papel no vaso, vai entupir quando eu vou dar descarga. Não rola.

O lance de tirar o sapato também ainda não me acostumei. Eu faço porque não tem outro jeito. Não vou ser a única que não tira os sapatos ao chegar na casa de alguém, mas os sapatos fazem parte do meu traje, e sem eles me sinto nua e desconfortável. É costume, tem gente que faz pra não arranhar o chão, pra não fazer barulho pro vizinho de baixo ou pra não trazer sujeira da rua pra dentro de casa. Na minha casa, eu prefiro receber gente calçada e lavar o chão depois.

O que já me acostumei

Por outro lado, já me acostumei a alguns hábitos daqui (e não só daqui) como beber água da torneira. Nos EUA também vivi isso, mas os suíços são muuuuito orgulhosos de seus alpes e já ouvi não sei quantas teorias de que por causa dos alpes sei lá como a água daqui é mais pura que em qualquer outro lugar. Então tá, ne. Ainda nas bebidas, eles são igualmente, ou talvez mais ainda, orgulhosos de sua tradição chamada Rivella. A famosa bebida feita de serum de leite é boa e saudável, eu gosto. Ouvi dizer que já tentaram exportar mas nos EUA não deu certo, e hoje só tem aqui, na Áustria e na Alemanha. Mas aqui, sem dúvida, a tradição é visivelmente mais forte, claro, o produto é daqui. As crianças crescem bebendo Rivella.

Andar de bicicleta é outro hábito do pessoal daqui. Muita gente não tem carro e depender do transporte público não é vergonha pra ninguém, pelo contrário, eu acho até luxo. Mas às vezes o tempo tá bonito e poder gastar o máximo de tempo possível ao ar livre é de lei. Aproveitar a natureza, respirar ar fresco, todas essas frescurices razões acentuam a motivação e a tradição do povo de andar de bicicleta pra cima e pra baixo e estar em contato com a natureza (in der Natur sein). No começo, eu achava isso estranho e bobo, mas hoje eu entendo. Ir pro trabalho, andar com os filhos com uma cadeirinha atrás ou só passear, não importa. É divertido. Aliás, só um dia desses fiquei sabendo da existência da bicicleta elétrica. Não chega a ser uma moto, mas é mais que uma bicicleta. É bem cara. Você ainda tem que pedalar, mas faz menos esforço. E agora entendo quando vejo gente subindo a ladeira de bicicleta na maior facilidade enquanto eu só falto morrer na minha mountain bike.

Regalias flexibilidade como tirar férias de uma semana pingada em qualquer mês do ano, fazer pausas do chá e pro café e sair do trabalho às 16h não é folga, é direito. Se você não usufruir dele, você é workaholic. Essa eu me acostumei fácil. O que impera é a qualidade de vida.

O que já desacostumei

Qualquer pessoa que saia do Brasil e vai morar em país desenvolvido sente, não é exclusividade minha nem da Suíça: preocupação de sair a noite. Em Recife, eu me arrumava pra sair de casa pensando se colocava meu relógio e meus brincos novos porque alguém podia me assaltar e roubá-los. Aqui eu saio vestindo qualquer coisa, com qualquer acessório, posso andar na rua com um carrinho cheio de celular, notebook, ipod, que ninguém aparece me olhando sob ar de ameaça. Aqui não tenho medo. Me desacostumar a ter medo? Moleza.


É muito fácil acostumar de um estado qualquer pro melhor, do ruim pro bom, do difícil pro fácil. Acho que no que depende disso, eu já aceitei as mudanças e os costumes. O que ainda não me acostumei é porque não me convenço que é melhor de alguma forma do que o que estou acostumada, então (por enquanto) mantenho meus costumes. Mas quem sou eu pra dizer que estão certos ou errados e que não mudarei? 

Acho que o bom mesmo é estar preparado o suficiente na mente e no corpo pra abraçar todas as diferenças, processos de mudanças e conseguir se adaptar sem grandes dificuldades. Toda mudança é um processo delicado. Mudança de hábitos e costumes é inicialmente um choque, e posteriormente o choque passa, e a situação requer tomadas de decisão. Precisamos passar por elas. Não é fácil, mas a gente pode tentar amenizar o grau de intensidade ou dificuldade nesse processo, pra depois conviver bem com nossas escolhas no dia a dia. 

Vou querer olhar pra este post daqui a algum tempo.

Marcadores: ,