Minha grande jornada

Meu pai morreu quando eu tinha 15 anos, num acidente de carro. Ali começava uma nova etapa da minha vida. Com 15 anos vc deixou de ser criança, está virando adolescente e começando a achar que entende alguma coisa do mundo. Eu morava em Natal, só tinha pisado fora do Brasil uma única vez, no ano anterior quando fui a Disneyworld. No mais, minha vida tinha sido estudar, colégio, curso de inglês, algumas mudanças, Rio, Brasília. Com a grande tragédia que acontecia, eu precisei em alguns momentos ser adulta e ajudar a carregar a dor que minha família não suportava. Foi duro.

Alguns meses depois eu estava nos EUA fazendo intercâmbio, não desisti. Tinha passado quase 1 ano planejando esse intercâmbio com meu pai, não ia deixar passar. Fui, voltei, morei em Recife, passei no vestibular e passei a morar só.

Eu começava então mais uma fase da minha vida. A fase de descobertas do mundo real, a de possibilidades inesgotáveis, a de achar que é dona da própria vida, só porque estava na faculdade. As pessoas me diziam que eu era inteligente, que eu ia longe, e às vezes eu me pegava no meu quarto pensando.. "será que sou mesmo?". Passei a me questionar, mas a vida em Recife tava tão boa, tão agitada com tantos amigos, namorado, e eu me mantinha ocupada.

Mas o tempo vai passando, vc se forma, seus amigos vão cada um pra um lado, vc começa a trabalhar pra ganhar um salário miserável de estagiária, e volta a refletir se tá certo o que vc tá fazendo. De repente as lembranças da época da faculdade parecem tão reconfortantes e voltar pra aquele ambiente parece ser a melhor coisa a se fazer. Então eu voltei pra universidade em busca de um mestrado, abandonei meu emprego, fisguei a bolsa de estudos e fui, mesmo sabendo que não seria como antes, porque nunca é possível voltar a estaca zero totalmente.

No segundo dia de mestrado me xinguei eternamente e perguntei que diabo eu tava fazendo ali, e aonde eu ia usar aquelas disciplinas com tantos cálculos e lógicas sem lógica no meu dia a dia. Aquilo ia me levar a algum lugar? Oh well, eu já tava bem grandinha, dona do meu próprio nariz e precisava me colocar fiel às minhas escolhas, eu já era adulta, não tinha como voltar atrás.

Na verdade, parecia que eu era adulta, sim, eu vivia no mundo adulto com professores e executivos apertando minha mão e marcando reuniões, mas eu não me sentia parte dele. Sei lá, eu tava doida era que chegasse sexta-feira pra me encontrar com minhas amigas no bar ou na boate e dançar a noite inteira. Mas às vezes chegava ao final do dia e me tocava que eu não tinha conversado nada com ninguém que não fosse de trabalho. Começava o conflito de emoções. Eu era forte e adulta e de repente era frágil e infantil. Me perguntava se eu ia encontrar meu lugar no mundo.

Mundo. Passei então a olhar o mundo. O que ele tinha pra me oferecer? A vida não podia ser só aquilo ali. Não era, disso eu tinha certeza. Onde eu poderia buscar conforto, ajuda, espaço? Onde eu poderia ir pra me encontrar? Do que eu gosto de verdade? Minha amiga ia casar, a outra tava grávida, e eu só discutia com meu namorado que dava a impressão de cada vez menos gostar das mesmas coisas que eu.

Parecia tudo tão confuso e eu precisava compreender o que estava acontecendo, estava perdendo o controle da situação. Seguir a vida do meu namorado parecia um caminho passivo e fácil. Seria isso? Enquanto isso, eu ainda tinha que acordar 6 da manhã, ir a reunião e me preocupar com o imposto de renda, descontos no meu salário e férias. Era o MUNDO REAL. Eu deveria estar confiante, madura, trabalhadora com a vida ganha. Mas sentia que ainda tinha a vida toda pela frente, e queria aproveitar as oportunidades.

Será que o que me disseram quando eu era adolescente, então, era verdade? Que eu tinha a vida inteira pela frente, que eu era inteligente e tal, é real isso? Só dependia de mim. Passei a dar valor às pessoas que importavam. Minha mãe nem sempre tinha as respostas pra mim, e meu pai, ah, já não estava mais aqui, minha irmã seguia a vida dela e eu tinha que aprender a depender de mim mesma e assumir meu lugar no mundo.


Passei a ser menos impulsiva, passei a ter mais consciência e ver que não tinha outro jeito a não ser enfrentar a vida. Eu tinha sonhos, queria transformá-los em realidade. Eu acreditava. Mas os acontecimentos me sufocavam, alguns ofuscavam meu entusiasmo e meu otimismo de vencer na vida. Era difícil ter atitude diante de chefes chatos, pessoas invejosas e colegas pessimistas. Claro, todo mundo tem medos e inseguranças, e eu que questiono tudo, também questionava ali meu caminho na vida, minhas escolhas, e tudo parecia sugar toda minha energia. Pelo menos aqueles babacas da faculdade e as panelinhas do colégio serviram de alguma coisa. Me ensinaram lições valiosas sobre comportamento e atitude

Eu não queria que a rotina acabasse com meus sonhos, tinha pavor da monotonia, e olhe que eu gosto de ficar em casa lendo um livro ou vendo tv sozinha na minha. Os questionamentos como "eu realmente quero isso?" não saíam da minha cabeça. E como é difícil dar o primeiro passo, nao?

Eu queria sentir de novo aquele entusiasmo de quando comecei a faculdade, de querer conquistar o mundo. Eu já tinha alguma experiência pra fazer as coisas acontecerem e queria me desafiar. Então comecei, me lancei no mundo e é preciso alguma habilidade pra isso. E é preciso também dar um duro danado pra manter vivo o entusiasmo da juventude, a ambição, a empolgação e energia pra se fazer as coisas que se quer. Porque o tempo vai passando, a idade vai se adiantando e são muitos os medos, inseguranças e fatores externos que têm força pra destruir tudo da noite pro dia. É preciso coragem, ser firme nas decisões, superar obstáculos, tudo porque não quero me tornar uma cética, cínica e indiferente ao mundo. Eu quero carpe diem.

Diante da realidade, os sonhos parecem tão inantigíveis e sempre parece mais fácil desistir. O easy way out é sempre so easy, indeed. Mas ora, eu nunca iria ficar num emprego que não valoriza minhas habilidades e não me dá oportunidades de crescimento. Eu quero dar o melhor de mim no que eu faço na vida, eu quero um futuro digno de ser celebrado, eu anseio pelo que vem por aí. Quem tem que viver minha vida todos os dias sou eu, então vou make the most of it e estar feliz com as escolhas que faço.

Não se aprende lições de equilíbrios da noite pro dia, mas escrevi este texto depois de ler três livros recentemente: "As 10 mulheres que você vai ser antes dos 35", de Allison James; "The best women's travel writing 2010", e "Viaje sozinha", de Flávia Soares Julius e Maristela do Valle. A combinação dessas três leituras me fez refletir muito e no primeiro livro obviamente me enxerguei em muitos cenários que a autora descreve. Escrevi alguns aqui, com certeza muitas também irão ter a mesma sensação.

Depois de tantas experiências e tanta história pra contar, eu quero hoje celebrar todas as vitórias, conquistas e momentos difíceis que me fizeram ralar muito pra conseguir alguma coisa. Estou prestes a viver um marco dessa minha jornada que é a primeira grande viagem sola que vou fazer na próxima semana. Já viajei sozinha, mas nunca pra um lugar tão significante como Israel. E isso pra mim tá sendo bem marcante, planejar tudo e mergulhar de cabeça nessa aventura desafiadora. Já ouvi tantos comentários e muita gente colocando pedra no caminho, mas eu levantei a cabeça e estou seguindo adiante com meu plano.

Estou inspirada e sei que vai ser um acontecimento interessante. Ora, eu quero tirar o melhor proveito possível da situação que estou vivendo hoje. Quero conhecer novos lugares, novas culturas, ter contato com outros idiomas e outros estilos de vida, viver este constante aprendizado e enriquecer meus conhecimentos, porque foi isso que eu busquei: independência, liberdade, aptidão para hoje aqui agora, disposição, com sede de desbravar e descobrir o que tem por aí, e poder fazer isso. Continuar crescendo. Vivendo a fundo minha grande jornada.

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