O que fazer em caso de acidente nuclear na Suiça?

Bom, antes que voce ache o assunto chato e nerd e que este blog perdeu o rumo, deixa eu explicar o contexto.

A Suiça é grande produtora de energia através de centrais nucleares, que usam materiais radioativos que através de uma reação nuclear produzem calor. As centrais nucleares usam este calor para gerar vapor, que é usado para girar turbinas e produzir energia elétrica.

Fonte: swissinfo
Bem, recursos em geral é meio complicado aqui na Suiça. O país é tão pequeno que apenas 4% da população trabalha com agricultura, por exemplo. Apenas 10% do seu território é bom para produção agrícola. Aqui, água é obtida das geleiras e fontes de ótima qualidade. 40% da eletricidade é obtidade de usinas nucleares e de grandes barragens localizadas nos alpes, enquanto que o restante é produzida em energias hidrelétricas, importada de outros países em grande época de consumo, como no inverno. No verão, a Suiça exporta energia, evitando desperdícios.

As centrais nucleares são normalmente construções muito complexas, com alto nível de segurança, isolamento e impermeabilidade. Reações nucleares são altamente perigosas e podem compromenter a saúde de nós, seres vivos. Aqui na Suiça, são 5 as centrais nucleares e são de um nível de segurança extremamente elevado e passa por um controle rígido do ENSI, o órgao federal suiço que fiscaliza a segurança nuclear. Mas não é de todo ruim. A grande vantagem é a não utilização de combustíveis fósseis, por exemplo, que são formados de composto de carbono, como carvão mineral, petróleo e gás natural. Vantagem porque a queima desses elementos causa impactos ambientais, forçam a mudança global do clima e são recursos naturais não renováveis.
Fonte: swissinfo
Em funcionamento normal, resíduos produzidos durante as atividades das centrais nucleares são retidos e cuidadosamente isolados, tratados na França e na Grã-Bretanha, embora não se possa excluir completamente o caso de uma pane dos dispositivos de segurança radioativa. Uma nuvem radioativa pode se formar e se movimentar com o vento. Aí nasce o problema.

Por esta razão, o assunto é muito polêmico por aqui, pois nem todo mundo tem noção do quão sérias são as consequências de um acidente assim, mesmo que as possibilidades de acontecer sejam pequenas, considerando o nível de segurança. Mas sendo possível, já preocupa, pois há casos no passado mundo afora que não são muito bonitos.

Muitos protestos contra projetos de novas usinas já aconteceram por parte de ecologistas e simpatizantes. Depois da explosão de uma usina nuclear no Japão por causa daquele terremoto no ano passado, a pressão aqui ficou ainda mais apertada e um grande projeto de uma nova usina foi suspenso pela ministra da Energia suiça e o país pretende abandonar essa produção até 2034. Claro, não é simples assim nem rápido. A desativação dessas centrais gera custos altos e as discussões continuam naõ só aqui mas em países que estão na mesma situação como Alemanha, França e Inglaterra, que são até menos flexíveis que os suiços. Entre os países vizinhos, apenas a Áustria abandonou a energia atômica desde 1978.

Nesse contexto, estou eu em casa me protegendo do frio do inverno, e fico sabendo que moro dentro de um raio de 20km de uma central nuclear, a de Mühleberg. Assim, pelo correio. Recebo um envelope da prefeitura com um monte de papeizinhos explicativos de o que fazer no caso de um acidente na usina aqui perto de casa?

Bem, Berna fica a 16km da usina nuclear de Mühleberg e a menos de 80 da de Gösgen, então há uma série de medidas e entendimentos necessários no caso de uma emergência dessa natureza. Em primeiro lugar, a população é alertada por uma sirene que toca no país inteiro e não só nas comunidades próximas às centrais nucleares. Aliás, há dias programados para 'ensaiar' essa sirene e a população 'lembrar' do procedimento. Ontem mesmo tivemos a sirene de treinamento e ela soa assim:

Uma coisa meio "O Dia Depois de Amanhã" praticamente. Quero ver se no dia que tocar sem ser um treinamento os suiços vão manter sua calma e diplomacia de sempre.

No meu caso e no caso dos meus vizinhos aqui, nós temos mais passos a seguir quando ouvirmos essa sirene, num dia que não for um treinamento (Deus queira que esse dia não chegue), porque moramos perto da bendita central nuclear.

Sirene soada, não só ficar em alerta máximo, mas desligar aquecedores, nada de usar fogão, fogo, telefone celular para evitar congestionamento de rede, manter os animais de estimação e crianças por perto, e ligar o rádio. Sim, ligar o rádio para ouvir maiores informações faz parte do procedimento. Os rádios estão instruídos a pararem tudo que estiverem fazendo para servir como principal meio de comunicação para com a população. Depois daí, pegar cobertores quentes, seu tablete de iodete de potássio e se dirigir ao porão do prédio ou ao abrigo mais próximo.

A questão dos tabletes de iodo de potássio é curiosa. Assim que voce se muda para Berna, chega na cidade e faz seu registro na cidade, recebe seu documento de identidade e junto, um monte de panfletos com instruções de como proceder com lixo, como fazer isso e aquilo, e junto vem uma caixinha de remédio, com potássio, que só deve ser usado nessa ocasião, sob comandos explícitos das autoridades no rádio ou na Tv. Acontece que o iodo de potássio protege a glândula tireoide do iodo da radioatividade, saturando o corpo com uma fonte estável de iodo antes da exposição à radiação, ajudando nosso organismo a se manter o mais saudável possível diante de potenciais reações internas. O iodo de potássio é aprovado pela Organização Mundial de Saúde e é normalmente usado para revelar fotografias e em tratamentos radioterápicos, embora a população suiça ainda se mantenha um tanto quanto cética em relação a esse procedimento específico.
As instruções são claras e parecem até simples. Vêm em Alemão e Francês. Recebemos também um mapa da zona da usina de Mühleberg, dois folhetos com check-list de passos a seguir e informações básicas de medidas de proteção em caso de acidente numa central nuclear e uma bolsinha de plástico com espaço para por essa papelada. Então vai o mapa, os tabletes e os folhetos na bolsinha e somos encorajados a deixa-la num lugar de fácil acesso dentro do apartamento. Caso aconteça o tal acidente, é pegar a bolsinha, ligar o rádio, pegar cobertores e se mandar pra um lugar protegido.

Todos os prédios na Suiça possuem porão, pelo menos um andar abaixo do nível do solo e alguns possuem uma espécie de "caverna" ainda mais embaixo para tais situações. Cada morador possui uma área, chamada de "keller" que normalmente é usada para guardar coisas que não são usadas com frequência no apartamento e não precisam ou não há espaço para serem guardadas dentro de casa, são postas lá, como equipamentos de esqui, malas, caixas, casinha de cachorro, no caso de Juca. Fica tudo lá embaixo no keller. A área passa por frequentes renovações, checagens e cuidados e é bom mesmo cuidar bem dessa área porque é individual e será bem necessária no caso de um acidente nuclear. Bem, estamos avisados.

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