A saga de encontrar uma creche

Quando fiquei grávida, depois que foi passando o susto e eu me dividia entre alegria e medo, uma das primeiras coisas que tive que me preocupar foi a questão do trabalho. Ora, vamos ser práticas. Em primeiro lugar, eu não era casada, não ia casar, não tinha um relacionamento estável suficiente para me sentir segura de que no matter what eu estaria garantida aqui. Minha vida era tudo menos segurança naquele momento. Porque segundo lugar, eu estava acima de tudo num país diferente do meu, onde não conhecia direito as regras, e o que me mantinha aqui era o meu trabalho, e não um homem. Portanto, deixar de trabalhar não era uma opção.

Aliás, mesmo que eu pudesse me dar ao luxo de ter opções, não escolheria deixar de trabalhar. Talvez se pudesse estender um pouco a licença maternidade e poder cuidar mais de perto do Edi por mais tempo, eu o teria feito. Mas largar tudo que eu lutei pra conquistar até aqui, definitivamente não.

Então estava eu grávida, totalmente perdida, sem poder dividir a notícia com muita gente e precisando de informações e orientações. As informações que encontrava na internet me diziam tudo que eu não precisava ouvir naquele momento: "A licença maternidade na Suíça é uma piada!", "Conseguir creche na Suíça? HA HA HA! Tem que esperar 2 anos!".... e tudo que lia me deixava ainda mais nervosa.

Me acalmei e começei a procurar então as opções que eu poderia ter. Já que deixar de trabalhar não era uma opção, descartei voltar para o Brasil, e não podia estender a licença maternidade, o fato era que eu ia ter que me dividir entre mãe e profissional, quando meu bebê estivesse com 5 meses. Bem, não é novidade que serviços aqui na Suíça são exorbitantes de caros, então mais uma questão a resolver. Sem poder contar com família, eu ia ter que entregar meu bebê aos cuidados de um "estranho".
As opções de "estranho" eram: Tagesmutter, que é tipo uma babá que cuida de bebes e crianças na casa dela. Voce leva sua criança à casa dela, ela cuida durante o dia, e ao final do dia, voce vai buscar. Bom, de cara eu descartei essa opção porque eu não sou tão desprendida assim pra deixar meu filho com uma estranha na casa dela logo de cara. Por mais profissional que seja, que seja registrado no governo e tenha recomendações, um adulto apenas, num ambiente não aberto aos outros, pra mim, parecia mente aberta demais. Então não. Próxima opção, bitte...

Próxima opção era ter uma babá em casa. Legal. Primeiro obstáculo: o preço. Serviço exclusivo é ainda mais caro que o normal. E, de novo, por mais profissional que seja e tudo o mais, deixar meu filho sob os cuidados apenas de uma pessoa, mesmo que na minha casa, um ambiente que ele conheceria, mesmo assim, fiquei de orelha em pé... não estou vendo o que está acontecendo, aliás, ninguém mais estaria vendo o que está acontecendo... e aí me vinha na cabeça todas aquelas cenas e reportagens nos jornais de babás maltratando bebes na sua própria casa... nãããão! Definitivamente NÃO! Cheguei até a entrar em contato com uma brasileira que viria exclusivamente pra cá pra isso, mas desisti no meio do caminho.

A outra opção era a creche. Aliás, a última opção, eu acho. Na creche, meu filho estaria sob os cuidados de um time, um grupo de pessoas, e não só uma. Pra mim, isso já era um ponto positivo. Meu filho estaria também em contato com outras crianças desde cedo. Eu ia continuar sem participar do seu dia a dia durante alguns dias, mas isso, não importa qual opção eu escolhesse, estava fora do meu alcance. Eu ia ter que dividir ele com o mundo mais cedo ou mais tarde. No meu caso, foi mais cedo mesmo ne, fazer o que.
Então, resumindo... a creche foi a minha escolha. Claro, ainda tinham vários problemas a driblar pra fazer isso acontecer, mas calma, que eu chego lá. Primeiro de tudo, eu tinha feito minha escolha, mas eu tinha que de fato, conseguir fazer minha escolha acontecer, porque achar uma creche aqui é tarefa árdua. E não é achar uma creche, é achar uma creche que te passe confiança, segurança, que voce goste, que voce ache que seu filho vá gostar, que não seja longe da sua casa, que o preço não seja tão absurdo, que fale os idiomas que voce queira, enfim! O buraco era beeeem mais embaixo.

A cada decisão que eu tomava, aparecia mais um mói de coisas a resolver. Ô gravidez aperriada essa! Mas não. Eu graças a Deus tive discernimento pra conseguir tomar as decisões que hoje vejo que foram certas, mesmo diante de todas as turbulências que passei. Então, ok. Primeiros passos. Comecei a catar as creches existentes em Zurique. De início, não precisava ser nem perto da minha casa, eu queria era sentir o "mercado", ver o retorno, ver se era mesmo quase impossível como eu tinha ouvido falar, depois eu me preocuparia em fazer a triagem.

Olha, no começo, parecia impossível sim. Os emails que mandava com os formulários de inscrição, em grande maioria, me respondiam assim: "Obrigada Frau Soares pela sua inscrição, mas no momento não estamos recebendo novas crianças", "Obrigada Frua Soares. Colocamos o nome do seu filho na nossa lista de espera, a média de espera é 1 ano". HAHAHAHAHAHA UM ANO???????????????? Perdi noites de sono com esse pesadelo de não conseguir arrumar uma creche a tempo de eu voltar a trabalhar. Pra piorar, ainda uma colega de trabalho estava pedindo as contas naquela época, porque tinha tido um filho e não tinha conseguido lugar numa creche pra deixar o filho dela. Putz!

Tentando manter a calma, recebi um retorno positivo de uma creche bilíngue, que era a 50 minutos da minha casa, lááááá na casa de chapeu, longe que só a bixiga. Fui lá. Edi ainda estava na minha barriga e lá estava eu pagando taxa de inscrição da creche. Como eu ia conseguir levar meu filho pra aquela creche tão longe, eu não fazia ideia. Mas nem que eu tivesse que me mudar pra perto da creche, o que era outro problema, eu tinha que garantir um espaço pra ele. Isso sem nem pensar na qualidade da creche, depois eu via isso.

Com essa creche lá no fim do mundo garantida, eu fiquei um pouco mais tranquila. Mas não deixei de procurar outras creches e deixei o nome de Edi em várias listas de espera. Conforme o tempo foi passando, eu recebia respostas confirmando que o nome dele ainda estava na lista de espera, alguns com uma estimativa de tempo, outras convidando para uma visita e outras por causa da estimativa de 1 a 2 anos, eu já cortava do meu plano imediato.

Aí vieram problemas na gravidez, meu problema nos rins me fez esquecer até do meu trabalho, e depois que melhorei, era época de Natal, minha mãe tava aqui, enfim, eram outras preocupações. Mas chegando 2013, voltei ainda a trabalhar 80% por causa do problema nos rins e diminuindo cada vez mais, apareceu outra creche mais perto da minha casa dizendo que tinha vaga e que eu tinha gostado. Fui lá visitar, me pareceu bem bacana, o espaço era novo, fiz 500 perguntas, e eu na esperança de estar fazendo certo, cancelei o contrato com a outra, e fechei novo contrato com esta nova.

Estava mais tranquila, pois não parecia que ia precisar me mudar... não que eu fosse, mas tudo bem. Edi nasceu, entrei em licença maternidade, e durante esse tempo, fui recebendo emails das creches onde Edi estava na lista de espera pedindo confirmação pra continua-lo esperando por uma vaga, outras dizendo que tinha vaga, que eu podia ir visitar e etc. E no meio de mais essa turbulência, eu ainda cheguei a visitar algumas creches, mas me dei ao luxo de ignorar alguns desses emails e ficar um pouquinho na minha, porque eu estava muito ocupada amamentando, trocando fralda e curtindo meu bebezinho.

Mas depois que as semanas foram passando, Edi foi crescendo, e o RH da minha empresa começou a me contactar pra confirmar minha volta e etc, eu me lembrei que existia um mundo real lá fora e a questão da creche foi voltando a me azucrinar. E assim, num dia como outro qualquer, estava eu aqui em casa com Edi, quando toca meu telefone e é uma creche perguntando sobra a vaga para meu bebe. Antes de dizer não, obrigada, ouvi e prestei atenção no endereço de onde era essa creche específica, e bateu um sino na minha cabeça PLIM! aquela rua é bem aqui do lado da minha casa. Então marquei de ir lá conhecer.
Fomos eu e o Eric com Edi pendurado em mim no babybjörn visitar a tal creche. Pra começar, sim, era bem perto de casa e dava pra eu ir andando, o que, mein Gott, era uma vantagem e tanto. Depois, lá no meio da conversa com meu Alemão devagar, a diretora da creche pergunta se eu quero continuar em Português. Ela é suíça, mas passou um tempo no Brasil e fala Português. Pronto, já quase me ganhou só aí. Pode fechar contrato já? E ainda, depois fomos conhecer o espaço, algumas das cuidadoras, da psicologia do lugar, do dia a dia, e pra minha alegria, me agradei bastante, senti confiança. Era essa!

Cancelei o contrato com a outra creche, correndo o risco de ter que pagar uma multa de mais de 2 mil francos, no qual tive sorte de serem legais comigo e me liberarem da multa, e fechei contrato com essa nova creche. Claro, tirando os detalhes administrativos e financeiros, ainda tinha o principal que era Edi se dar bem na creche, de a creche ser realmente boa, com boas profissionais, que gostem e saibam realmente cuidar e lidar com crianças. Mas isso não tá escrito em papel nenhum, e mesmo que haja recomendações e coisas do tipo, é preciso arriscar. Mas olha, a sorte está do meu lado. E Deus em deu uma ajudinha. Hoje olhando pra trás todas as N creches que visitei, essa última foi de fato a que mais me agradou em questão de: espaço, time, organização dos grupos, impressão geral do trabalho com as crianças e claro, localização.

Edi começou o período de adaptação sem nem saber o que tava acontecendo. Como ele começou muito novo, hoje com 8 meses já vai sorrindo e se sente super a vontade com as outras crianças. É a segunda casa dele. Mas olho ao meu redor e pro país, e a sensação que tenho é que a Suíça não está preparada pra gravidezes não planejadas como a minha. Nem tem estrutura pra apoiar famílias jovens. Ora muito pelo contrário, uma gravidez aqui se não for muuuuito bem planejada, é muito difícil de ser levada a cabo. Não é a toa que o número de abortos é altíssimo no país, e é legalizado. Se não tiver também dinheiro não dá. Porque ou a mulher deixa de trabalhar e tem que ser sustentada pelo homem pra poder cuidar do bebe, ou precisa de grana pra terceirizar os serviços e conseguir dar conta da dupla jornada. Mas isso é questão pra discutir mais a fundo, e já entra em vários aspectos que eu não preciso abordar aqui.

Os detalhes e os critérios que eu aprendi (na marra) de como avaliar uma creche e como funciona o esquema das creches aqui em Zurique, eu conto em um post separado. Aqui foi só pra dar um gostinho de aventura e drama em mais essa fase que passou pela minha vida: a busca de uma creche! Nossa, nunca vou esquecer. Hoje to dando risada, mas foi um aperreio. Graças a Deus no final tudo se resolveu, e tá indo muito bem, mas eu acho que tive sim um pouco de sorte. Porque tanta coisa podia ter sido diferente e bastava uma só ter sido diferente pra dar tudo errado. E se eu tivesse que pagar a multa de cancelamento? E se eu não tivesse encontrado uma creche bacana? E se não fosse perto da minha casa? E se Edi não tivesse se adaptado? E se não soubessem cuidar direito de um bebe? Acho que no final de tudo, mesmo com todas as turbulências e dificuldades, não tem outro sentimento senão orgulho, alivio e satisfação de no final estar dando tudo certo.

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