De volta a Berna

Se eu tiver o privilégio de um dia poder escrever outro livro, vou começar com "Era uma vez...". O cenário que vou tentar descrever para que você leitor imagine será esse aí da foto abaixo:
Antes que me empolgue demais nos meus sonhos, vou voltar a realidade. Ai ai, vejam só... que o curioso é que o sonho é a realidade. O cenário do livro não é de faz de conta, a foto acima e abaixo foi eu que tirei, não é imaginação.
Será que algum dia, sei lá, depois de 30 anos morando aqui, vou perder esse deslumbramento que tenho pela beleza dessa cidade? Eu voltei para Berna em outubro do ano passado, depois de pouco mais de 2 anos em Zurique.  Tinham sido quase 4 anos vivendo em Berna até então. Quem acompanha esse blog deve ter percebido a disputa entre as duas cidades na minha preferência, mas o quanto eu curti morar em Zurique. E juntou ainda com o período da minha licença maternidade, pronto. Tantos parques, a orla do rio, do lago, oh que saudade. Sinto saudade sim.
Mas comparar com Berna é tarefa difícil. Berna é peso pesado, tem um lugar especial no meu coração. Mas não apenas pelo lado sentimental porque foi aqui que tudo começou há quase 6 anos atrás, quando vim de mala e cuia ver se dava certo um contrato de trabalho num órgão das Nações Unidas. Tanta coisa aconteceu, tanta gente eu conheci, tanta coisa eu vivi. Olho pra trás e vejo que aprendi a andar por Zurique, gente, Zurique! e hoje eu a conheço como a palma da minha mão. Mas Berna... não é que eu apenas saiba andar por aqui, ela está gravada em mim, foi aqui que começou toda minha história de vida com a Suíça.

Não tem a ver com pessoas nem amores certos ou errados, estou falando de destino. É claro que não tem como não se apaixonar pelas ruas medievais e pelos trams vermelhos que cruzam a cidade, pelo relógio secular que é o coração da cidade e os ursos do parque que imprimem o maior cartão postal daqui. A capital helvética pode não ser o maior centro financeiro, turístico e social do país, mas sem ela a Suíça perde em tradição, cultura, riqueza. Riqueza de detalhes, de história. É a partir de onde a Suíça alemã vira Suíça francesa, onde os trens têm de parar, uma capital do interior, mas interior da Europa, da Suíça, onde tudo tem a melhor qualidade.

Qualidade de vida... pronto. Deve ser isso. Maior que aqui, não vou encontrar em lugar nenhum. Aqui estou em casa, sinto meus pés no chão, conheço cada pedaço, não consigo explicar direito. Berna pra mim é uma das cidades mais lindas do mundo, e do mundo eu conheço. Não é apenas sobre parques, passeios ou vibe cultural, que talvez na superfície Zurique vença a batalha, e ela tem seu mérito. Mas Berna é a certeza que tudo está em paz, nos conformes, como deveria estar. É o dia a dia, a rotina gostosa de viver, enquanto Zurique eram minhas férias, ou meu trabalho cheio de horas extras. Berna não é de extremos, Berna é a constante, mas sempre indo. Uma coisa fora do percurso por aqui é exceção. Berna me passa segurança e é como se eu pertencesse a ela já. Fui e voltei e ela estava aqui para me acolher. Pode me dar a prova pra virar suíço, se depender de Berna, eu passo.

Aquela sensação de "não sei se vou ficar aqui muito tempo" que todo expatriado ou refugiado tem, acho que ainda não me livrei, e devemos estar mesmo todos destinados a ela para sempre, mas olhe, todos no fundo sabemos o que devemos fazer para lidar melhor com nossa inquietação. Só pode ser. E não é sobre trabalho, namorado, filho, apartamento bacana nem custo de vida não. Influências externas todos temos. Só que a sensação agora, mesmo que seja um dia passageira, é que daqui eu não saio, daqui ninguém me tira. E que seja eterno enquanto dure.

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