Sabe quando você olha pra trás na sua vida e ve o quanto você era diferente, lembra das suas ações e pensa "nossa, essa era eu!"? Pois é. Talvez porque seja Dezembro e é época de fazer muitas reflexões, então em mais uma dessas vezes que páro pra pensar, me vi em algumas situações, me vendo em outras pessoas, como eu costumava ser, como eu já fui um dia, e me toquei do quanto eu mudei nesse meio tempo.
No ônibus outro dia, apertei o botão pro ônibus parar na próxima parada e antes que eu chegasse na porta próxima ao motorista, uma pessoa se levantou e parou na minha frente, pra sair primeiro que eu. Sem problemas, esperei atrás dela o ônibus parar e quando a porta abriu, ela saiu calada sem nem olhar pra trás. "Nossa! A pessoa nem fala com o motorista!!!". Eu na minha vez de sair, imediatamente após essa pessoa, olhei pro motorista e disse "Obrigada, bom dia! Tchau", e ele me respondeu, e só então eu saí do ônibus. Sair sem cumprimentar o motorista. Coisa que antes pra mim eu nem ligava ou quando comecei a perceber que as pessoas faziam isso, pensava "nossa, tem que cumprimentar até o motorista!". Hoje em dia é automático pra mim. Se estou a sair pela porta próxima ao motorista, sempre viro pra trás, agradeço e desejo um bom dia, um bom trabalho.
Eu quando vou jogar o saco do lixo no container perto de casa, vejo um outro saco de lixo já lá próximo ao

container, não dentro do container, meio entreaberto e com latas de alumínio e caixas de leite. Minha Nossa! Como é que a pessoa mistura latas de alumínio e caixas de papelão de leite no saco do lixo! Primeiro que alumínio é reciclavel, tem que jogar ali na máquina e rodar a válvula para tritura-lo, assim como o papelão que tem que ir num container específico para sua reciclagem. Misturar os dois junto com sei lá mais o que vai causar impacto no meio ambiente. E não é que eu também não fazia isso antes? "Ah, eu vou lá me preocupar com isso!" - era meu pensamento. Não foi automático não, tipo, agora moro no exterior, virei educada. A minha preocupação com o meio ambiente veio vindo aos poucos, acho que tem a ver com amadurecimento também. Mas não tem como negar que a cultura ao meu redor contribuiu. Tambem porque pagando pelo saco do lixo a gente é forçado a parar pra pensar e se preocupar com o que que a gente tá enchendo ele. Tá muito cheio, já precisa de outro saco! Gente, um saco custa quase 2 francos, vamos economizar! E como? Tira as latas, as caixas de papelão, a garrafa pet! Hahahaha, ok, garrafa pet é demais. Mas nossa, como eu era ignorante. Fui obrigada a aprender e me dar conta do que eu colocava no meu lixo sim tambem por causa do preço que eu pagava pelo saco do lixo. Me lembro numa festa que fiz na minha casa pouco tempo depois de chegar aqui com os primeiros amigos, e no dia seguinte aquele monte de garrafa na cozinha, eu não sabia nem o que fazer com elas. Foi o Eric (o pai do Edi) que riu comigo da minha ignorância e me ensinou. Depois fui vendo o processo do caminhão tirando as latinhas, os papelões e levando para a reciclagem. Li uma matéria outro dia no jornal de como esse processo ajuda no meio ambiente. Nossa, eu ajudei também, coloquei lá minhas latinhas e meu papelão. Quero continuar ajudando! Esse é o espírito. E por aí foi. Hoje em dia acho um absurdo que eu já tenha misturado tudo e não tenha nem me preocupado com isso antes, até chegar aqui. Por que não fiz isso no Brasil também?
"Gente do céu, tem que tirar o sapato pra entrar em casa! Vou ficar com frio no pé. Vou parecer desarrumada sem meu sapato. Não combina ficar de meia com essa roupa!". E eu era obrigada sim a tirar os sapatos antes de entrar na casa de alguém e deixa-los na porta. Durante a festa/almoço/jantar, todos aqueles sapatos lá na entrada, minha nossa, cade o meu?! Essa era minha cabeça em 2009. Achava esquisito demais todo mundo de meia em casa num evento. Com o tempo, prestando atenção nisso, e nos eventos que eu organizava na minha casa, eu mesma dizia "não, não precisa tirar o sapato não", e depois que todo mundo ia embora, Jesus amado, quanta sujeira dentro de casa! Realmente teria sido mais prático se eu naquela época tivesse seguido o costume suíço e mesmo achando esquisito, concordado em todo mundo tirar o sapato pra entrar na minha casa. Hoje em dia, nem o Edi entra em casa de sapato. Juca limpa e lava as patas regularmente. Não quero ninguém trazendo sujeira da rua pra minha casa porque primeiro que quem limpa sou eu, depois porque fica mais confortável todo mundo de meia em casa, não é mesmo? Questão de higiene. Ou de hábito.
Outra coisa é que eu quando vou ao Brasil hoje em dia: vou ao banheiro e jogo papel no vaso, dou descarga, o vaso entope. Putz, esqueci que não estou em casa! Antigamente, o costume era jogar papel sujo do banheiro na lixeira e não no vaso. Mesmo aqui na Suíça eu me sujeitava a isso e gastava muitos saquinhos de plástico e energia tirando e botando saquinho novo com muita frequência, e ainda me sujeitando a sentir aquele cheiro agradável (#not) de sujeiras de dias atrás. Aqui na Suíça alguns banheiros nem lixeira têm. Se precisar jogar absorvente ou outra coisa, enrola num saquinho e deixa no recipiente específico pra isso ou deixa no cantinho que será apanhado. Pois qualquer papel higiênico pode e deve ser jogado no vaso e dado descarga nele. Que estranho quando alguém vem aqui em casa e percebo que usou a lixeira para jogar papel higiênico. E pensar que eu também fazia isso naturalmente.

Em 2009, 2010, chegava numa festa e procurava um rosto conhecido pra ir conversar. Não falava com quem não conhecia e achava todo mundo muito esquisito quando chegava e ia se apresentar a todos que já estavam na festa. "Eu, não, não conheço ninguem, quem quiser que venha falar comigo.". Que falta de educação! Quem chega, é quem fala oras! Hoje eu chego nos lugares e vou apertar a mão de cada um, digo meu nome, espero a pessoa falar o nome dela, e a saúdo. Antes de ir embora, da mesma maneira, me despeço de cada um, tipo, isso é o básico da educação. Como é que eu não era assim antes?
Lembro que há uns anos, um dia quando eu cheguei no trabalho, tinha quatro pessoas, duas e duas conversando entre si, passei pelas quatro, dei bom dia, ninguém respondeu. "Nossa, que falta de educação, ninguém me respondeu bom dia!!". Sento na minha mesa, ligo meu computador, começo a trabalhar, depois de um tempo, lá longe escuto um "Ah bom dia Liana". "Hum, ficou com dor na consciência que não falou bom dia na hora que eu cheguei?!" - pensava eu. E depois, todos continuam a trabalhar em silêncio. Isso foi há alguns anos. Semana passada estava eu no trabalho, tinha chegado cedo e estava conversando com um colega, quando chega outro colega, passa por nós, não diz nada e senta do nosso lado. Quando terminamos nossa conversa e nos direcionamos pros nossos lugares, dizemos quase que simultaneamente "Bom dia, Markus", e ele nos dá bom dia também. E aí me toquei que, nossa, que óbvio, é claro que ele esperou a gente terminar de conversar para dar bom dia. Teria sido realmente estranho se ele entrasse e desse bom dia e eu tivesse que interromper minha conversa com o outro colega para dar bom dia pra ele. Tipo, óbvio isso. E aí me lembrei da situação semelhante de anos atrás e da minha reação do outro lado da situação. O mundo da voltas mesmo.
Pode parecer bobagem e situações engraçadas, mas são lições de costumes, de "novos" costumes. Com mais paciência, mais atenção, mais responsabilidade, mais educação. O jeito suíço de levar o dia que hoje pra mim até ri aqui pra escrever esse post porque é tudo tão óbvio, porém vejo que antes não era. Que antes a esquisita era eu de interromper todo mundo pra dar bom dia e ainda exigir que eles parem o que estão fazendo para me responder, que não falava com as pessoas que estavam numa festa, num almoço, porque eu não as conhecia, e achava estranho quem ia lá se apresentar um por um! Eu que ficava em casa de sapato! Que misturava o lixo e que nem falava com o motorista do ônibus que eu acabei de sair. Realmente, que menina esquisita que eu era. Como eu cheguei diferente aqui, ou melhor, como eu mudei depois que cheguei aqui. Confesso que sem perceber terminei abraçando alguns costumes suíços e hoje fazem parte do meu comportamento, da minha reação com as coisas e das minhas ações principalmente.
Sim, acho que se eu me visse, uma clone de mim mesma, a Liana que chegou aqui em 2009, eu ia achar sim ela meio esquisita. Com a cabeça que e comportamente que tenho hoje. Não que brasileiro seja esquisito, porque eu continuo sendo brasileira, mas alguns costumes meus de antes já se foram, já mudaram, e acho que não vão mais voltar. Tantos anos de Suíça teriam que, sim, causar algum impacto, não é mesmo? Não só à própria Suíça, mas dou créditos de tudo isso também ao amadurecimento natural que vem com a idade e à maternidade, principalmente. Por observar mais os outros, por me colocar mais no lugar dos outros, por perceber mais e mais coisas e dar mais importância ao que está a minha volta. Definitivamente eu não sou mais a mesma.