Albania

A Albânia também foi parte do império Otomano, que eu contei aqui no post da Turquia. Lá na Turquia, conhecendo Instambul, a antiga Constantinopla, capital do império Otomano, não tem como ficar neutra diante de tanta coisa que os otomanos construíram. O império se estendeu pelo norte da África, Oriente Médio e sudeste Europeu.
Tirana, capital da Albânia
Mas sabe, talvez não seja certo começar falando da Albânia como mais uma região que foi parte do império Otomano. Mesmo antes dos Otomanos chegarem, os bizantinos, os romanos e os ilírios já haviam passado por ali. Sem falar nos gregos da pré história. O continente europeu é habitado desde muitos e muitos tempos, se for remeter a esses tempos, eu só escreveria isso aqui nesse post. E pra falar a verdade, não sou historiadora nem sei muita coisa. O que escrevo aqui é o que leio, o que aprendo com as viagens. Acho que o que me interessa é como a Albânia de hoje foi afetada pra ser o que é. Obviamente tenho que voltar ao passado e entender o que aconteceu por ali, mas na medida certa.

Então saber que o império Otomano lutou pela região que é hoje a Albânia contra sérvios, húngaros, bósneos, búlgaros e os próprios albaneses locais é sem dúvida interessante pro meu entendimento.

A minha curiosidade de ir até a Albânia mesmo sujeita a passar pelo sufoco que passei foi acatada porque era muito perto da Macedônia, onde eu resolvi ir passar a Páscoa, ali na península balcânica. Li sobre a Albânia, não vi nenhum perigo momentâneo, nenhuma ameaça de conflitos, nem nada, porque né, nunca se sabe direito o que está acontecendo nessas regiões que são meio fora de rota. E então resolvi ir. E ir pra mim não é só ir, é saber o que rolou ali, é conhecer a história, é catar um guia que me explique os fatos, que me leve pra ver os principais pontos. E nesse tipo de viagem eu não tenho problema nenhum em ir só sabe, porque aí posso "viajar" o quanto eu quiser!
Kruja, a cidade de maior resistência ao Império Otomano na Albânia
E assim em 2 dias aprendi coisas que nunca vi na escola. 
A Albânia se tornou independente do império Otomano depois da primeira Guerra dos Balcãs, em 1912, um conflito bélico entre Sérvia, Montenegro, Grécia, Romênia, Turquia e Bulgária pra decidir a quem pertenceria os territórios restantes que tinham sido dos Otomanos. Só que a Albânia foi governada pelos Otomanos por muitos séculos e com a independência, ficou instável e insegura. 

Depois da Segunda Guerra Mundial, a Albânia foi liderada pela mesma pessoa, Enver Hoxha, até 1985, ou seja 44 anos. Hoxha era seguidor da antiga liga stalinista, forma de poder político da União Soviética da época de Stalin. Pelo que aprendi e vi nesses intensos dias na Albânia, digamos que essa forma de governo não foi muito saudável. Há um termo para caracterizar formalmente o governo de Enver Hoxha na Albânia: isolacionismo.

Se voce estudou isso na escola, ótimo. Porque isso aqui é um mergulho na história. Já deu pra perceber que eu não fui pra Albania pra relaxar ne? Em suma, Enver Hoxha fechou a Albânia para o resto do mundo. Hoje, pra voce ter ideia, um dos (se não o único?) países que segue essa forma de governo é a Coréia do Norte. Por 44 anos, a crença ou o sistema político tentava evitar que o governo fosse enfraquecido mantendo o país longe de ideologias e qualquer coisa que pudesse afetar as organizações nacionais, o regime da época. Ditadura é um termo fraco pra caracterizar o que a Albânia passou. Segundo meu guia, a Albânia foi o país que mais penou com o regime socialista.
A Albânia se mantia ignorante para tudo que se passava no resto do mundo. Eles não conhecem bandas famosas da década de 70, não tinham acesso fácil a televisão, meios de comunicação. Foi uma época de destruição moral que não tem guerra que dê jeito, o tempo não volta. As pessoas foram subversionadas, transtornadas, obrigadas a viver de uma forma porque um homem que estava no poder achava isso certo.
Ponte do século 16 em Tirana
Por outro lado, essa também foi por algum tempo uma época de renovação e tentativa de retomada de orgulho próprio para o país. Pelo menos por algum tempo! Após tantas mortes na Segunda Guerra, as Nações Unidas contribuiram para a nacionalização de bancos, indústrias, transportes. A Albânia ainda tinha um bom relacionamento com a Iugoslávia, Belgrado dava assistência ao seu país vizinho, embora as relações diplomáticas com os EUA e a Inglaterra tenham estremecido por suspeitas de encorajamento da oposição.

A história infelizmente continuou num rumo não muito favorável para a Albânia. Em meados da década de 50, as relaçoes entre a União Soviética e a China enfraqueceram e a Albânia cometeu o erro crucial de ficar do lado da China. Por causa disso, em 1961, a antiga USSR quis se separar totalmente de qualquer relação com o país. Em 1968 a Albânia se retirou então do Pacto de Varsóvia do qual foi fundadora, onde através deste, os países socialistas do leste europeu e a União Soviética mantinham uma aliança militar. Estando fora dele, a Albânia estava isolada no seu regime socialista.

Era praticamente o fim do país. Nesta época, no auge da Revolução Cultural Chinesa, a Albânia resolveu banir quaisquer prática de religião e se declarou o primeiro país ateísta do mundo. Padres foram presos, mortos, igrejas e mesquitas foram fechadas, demolidas ou transformadas em depósitos de qualquer coisa. De acordo com o meu guia, foi a pior época que a Albânia já viveu. Era pior que uma prisão, pois estavam "livres" mas não tinham liberdade pra fazer o que queriam. Bizarro, mas ali estava eu passando a Páscoa no país que passou mais de 20 anos ateísta...
Prédios em Tirana
Mas vamos continuar com a história! Depois da morte do principal governante chinês na época, Mao, a China perdeu o interesse na Albânia e o pouco que apoiava o país se resumiu a nada no final da década de 70. A Albânia não tinha nenhum aliado político para se proteger, não tinha relações diplomáticas com absolutamente ninguém mais, estava totalmente abandonada e sozinha, sem condições de se manter. A primeira atitude que se foi então tomada foi tentar reestabelecer algum acordo com seus vizinhos da Iugoslávia, e após o restabelecimento da democracia, com a Grécia. Os albaneses estavam cada vez mais isolados do mundo.
Kruja
A reaproximação da Iugoslávia dividiu opiniões e Hoxha eliminava sem olhar pra trás quem discordasse dele. Muitos rumores e atentados anônimos começaram a acontecer. O povo estava revoltado com o sistema sob o qual tinha que viver, e a pressão aumentou consideravelmente nos principais prédios do governo em Tirana, capital do país. Assim nasceu finalmente o partido da oposição, o primeiro partido da democrático do país. 

A década de 90 ainda viu muitas greves e revoltas de estudantes que não aceitavam o regime albanês da época, muitas promessas que não eram cumpridas. A Albânia era um lugar de conflitos constantes, era perigoso estar lá. No meio desse auê todo, o Partido Democrático tentava ganhar as eleições e derrubar o regime de Hoxha que apesar de não estar mais no governo nesta época, seu partido, o PPSH (ou Partido Trabalhador), ainda estava no poder. Mesmo perdendo as eleições, os democratas levantaram uma greve nunca antes vista na história daquele país e assim finalmente tomaram posse em 1992.

Os conflitos não acabaram assim tão fácil, obviamente. A Albânia tinha pontos a melhorar em todas as áreas. A turbulenta década de 90 ainda foi agravada pelos conflitos no Kosovo, na Sérvia e na Bósnia.

A Albânia hoje é um país democrático, mas sua economia ainda é muito fraca, a taxa de desemprego é altíssima e o orgulho ferido dos albaneses é um problema. Também não é pra menos, depois de tantos conflitos e tanta instabilidade, mal podia eu acreditar que eu estava lá turistando e ouvindo os relatos de quem viveu tudo isso.

Muitos albaneses deixaram o país nesta época pra tentar uma vida mais tranquila. Mas quem viveu tudo isso lá na Albânia, como meu guia por exemplo, tem na memória todas as marcas de toda uma história. A história que fez o que a Albânia é hoje. Eu poderia ficar ali escutando os relatos dele sem pensar no amanhã. Olha, foi muito emocionante e ao mesmo tempo difícil estar lá ouvindo como eles passaram fome, como eles não podiam ter nada sem que o governo soubesse, ouvindo todas as atrocidades a que eram submetidos, e tantas dificuldades que até pouco tempo atrás estavam acontecendo.

As marcas do socialismo sem dúvida ainda estão pelas ruas de Tirana. As casas e os prédios daquela época em Tirana são todos iguais. Não podia haver diferença entre as pessoas, apenas os governantes podiam se sobressair. Olha, eu tenho muito ainda o que contar. Tirana, Kruja e Dürres, por onde passei, tem lindas paisagens, e apesar de não ser muito popular ainda pra se fazer turismo, o litoral adriático está começando a se tornar atraente para férias de verão dos europeus. 


Eu passei um perrengue danado na viagem de ônibus da Macedônia pra lá. Mas depois de conhecer a Albânia, sua história... pergunte se eu faria de novo? .... preciso responder?

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