Organização financeira

O tema desse post foi uma sugestão de algumas leitoras. Bom, o tema "dinheiro" sempre foi pergunta frequente aqui no blog, algumas até bem diretas mesmo, tipo "Liana, quanto você ganha aí?", e outras só querendo entender como é possível se sustentar aqui na Suíça, sustentar uma casa, um filho, viagens, estilo de vida, etc. 

Eu até entendo que gere curiosidade e desperte interesse em saber como é a gestão de tudo isso. Para nós brasileiros, a vida na Europa parece ser sempre repleta de coisas de boa qualidade, coisas caras e com tantas viagens, dá a impressão que somos ricos. Falsa impressão. Pra mim, a minha vida é uma vida normal. Não há extravagâncias nem luxo, apenas justa, eu diria. Não vou dizer aqui quanto eu ganho, mas meu trabalho me proporciona um salário justo suficiente pra viver tranquila, confortável, sem precisar contar as moedas pra pagar as contas. Aliás, como deveria ser sem gerar questionamentos, mas ok. 

Claro, quando eu faço uma viagem grande por exemplo, que preciso investir um pouco mais, pagar hoteis, passagens e etc, é de repente o mês que tenho que aliviar de outro lado, como não comprar sei lá, produtos de cabelo, trocar o liquidificador que quebrou, ou pagar o imposto da TV de uma só vez. 

Não tem mistério gente. Eu tenho 33 anos, sou uma engenheira de software, tenho um emprego e uma vida pra dar conta, ou melhor duas. Mas quanto a minha gestão pessoal, posso esclarecer algumas coisas. Bem, quanto ao planejamento financeiro, eu tenho o costume de compensar uma coisa pela outra. Mesmo podendo ainda ter uma folga em um mês, não gosto de chegar ao limite gastando todo o meu salário do mês, porque ne, nunca se sabe. Fiz um post sobre custo de vida na Suíça há um tempo atrás e dali dá pra ter uma ideia de quanto custa aluguel, contas, principais gastos e etc. O que eu posso dizer além disso?

Não tenho muito mais a quem dar créditos a não ser ao meu trabalho mesmo. Não tenho outra renda além dele. Como falei no vídeo explicando sobre como eu vim parar na Suíça e como continuo vivendo aqui (quem não assistiu ainda, assita aqui!), eu me sustento eu e Edi aliás por mim mesma. Bom, tem também as vendas do meu livro mas ne, cof cof, até agora só me ajudou a pagar a atualização do meu anti virus e comprar uns guias de viagens. Tipo, não vivo disso claro.

Meu trabalho também não é o melhor e mais bem pago trabalho do mundo. É um trabalho de informática normal. Eu sou formada em ciência da computação, tenho mestrado em engenharia da computação, sou gerente de testes de software numa boa empresa graças a Deus, e normalmente tenho um cargo de nível de experiência intermediário. Tipo, tem gente abaixo de mim, mas tem muito mais gente acima de mim. No meu antigo trabalho, eu tinha um time em que eu era a lider, a chefe. Hoje eu sou parte de um time enorme e dependendo do projeto tenho um time ou não. No meu atual projeto, eu trabalho praticamente sozinha na minha área, só que meu trabalho faz parte de todo um desenvolvimento do sistema que estamos trabalhando, então não é sozinha, mas é meio independente dos outros.

Tipo, informática e computação, a área de TI (Tecnologia da Informação) em geral é uma área bem aquecida economicamente, há empregos e os empregos pagam bem, tipo, pagam normal, suficiente pra você viver bem. No meu trabalho hoje eu tenho uma certa autonomia mas não sou chefona não. Também já tenho 10 anos de experiência profissional só nessa área, certificados profissionais, então tem coisa pra ser levada em conta, dá uma certa credibilidade. O salário funciona diretamente proporcional a esses fatores. Me permite me sustentar, trocando em miúdos: pagar um apartamento confortável e moderno, hoje eu moro num apartamento de 2 quartos relativamente grande, 96 metros quadrados, numa área tranquila de Berna. É mais do que eu estava disposta a pagar, quando me mudei de Zurique de volta pra cá, mas em pouco tempo pra organizar uma mudança, foi o que eu consegui disponível. Eu gosto daqui, é caro, mas é uma ótima área residencial, tem parquinho pro Edi, vale a pena e dá pra ir levando. Daria pra conseguir algo mais barato mas só o stress de ficar visitando apartamentos, me candidatando e buscando aff, não estou em condições de fazer outra mudança nem tão cedo.

Tipo, há coisas que você não pode deixar de pagar todos os meses, como aluguel, plano de saúde que é obrigatório aqui, a conta de telefone, a creche do Edi. A creche do Edi é um grande rombo nas minhas contas, mas não tenho pra onde correr. É uma creche privada, pois, de novo, me mudei de volta pra Berna em pouco tempo e não deu pra arrumar uma creche pública que pudesse pedir subsídio do governo. Estou na lista de espera de algumas mas daqui que saia a vaga, já deve estar na hora de Edi ir pro jardim da infância. Jardim da infância diga-se de passagem é de graça, mas só vai até às 2 da tarde (mas isso será outro problema...). De qualquer forma o subsídio do governo para a creche é de acordo com seu salário e com o meu, consigo no máximo uns 30% de desconto, que ajuda, mas não é aqueeeela diferença.

As contas que são além das fundamentais que falei antes, dependem de mim e eu posso manipula-las, tipo, meu cartão de crédito. Tem mês que a fatura vem lá em cima, mas aqui não há financiamento que eu pague algo em várias parcelas, então se preciso abaixar a conta, depende de mim não usar o cartão ou usa-lo pouco num mês, e assim no mês seguinte, a conta vem mais baixa, e eu desembolso menos para paga-la e sobra mais dinheiro pra outra coisa. Assim também funciona os gastos com comida, almoço fora, janta fora, lanches, passeios, lazer, etc. É questão de organização e controle. Eu confesso que não sou a louca dos controles e tenho exatamente na cabeça quanto devo gastar pra não sair do limite, mas se um dia todo meu time no trabalho ou um grupo de amigas resolver ir almoçar num restaurante bacana, não vai ser por causa de 50 francos que eu vou gastar lá, que eu vou deixar de ir. Porem gosto de economizar e compensar as vezes levando almoço de casa, almoçando uma salada ou sanduiche baratinhos pra não precisar gastar todo dia 20, 30 francos pra almoçar.

Aqui não tenho empregada, a faxina de casa é a minha fitness semanal, e eu aprendi a fazer doses de amelia pra doer menos, tipo um dia passo umas peças de roupa, outro dia eu lavo outras, outro dia não faço nada e no outro passo o aspirador. Sem stress nem hora definida, quando eu tiver saco. Faz parte da minha rotina. Se tem por exemplo um mês que to mais folgada ou que estou mais cansada tambem vale, chamo alguém pra fazer uma mega faxina aqui em casa e desembolso aí uns 200 francos que não estavam no orçamento original. Compensa. E assim nesse esquema realizo outras coisas como corte de cabelo, pintura, comprar algum móvel novo... isto é, quando dá.

Sempre tem coisas a fazer em casa, coisas novas a comprar, então a melhor forma é definir as prioridades mesmo. Tipo, desde que me mudei preciso comprar um móvel aqui pra sala pra por o resto dos pratos e louças da cozinha que não couberam todos nos armários que têm na cozinha, e até hoje estão tudo em caixas de mudanças ainda lá no meu quarto. Só agora consegui me organizar pra comprar um. Questão de prioridade. Até então sempre tive outras coisas mais importantes pra investir meu dinheiro, tipo armários pro quarto de Edi, uma cama nova pro Edi porque o berço dele tava quebrando, cortinas, lençois novos, enfim.

Em assunto viagem, claro, eu gasto. Mas eu gasto com prazer, sem pena. Pra mim é um investimento, então eu me programo pra saber quanto posso gastar nas próximas viagens e assim posso planejar sem problemas. O plano das viagens entra na conta do cartão de crédito. Se eu vejo que vai passar muito do que eu normalmente pago, ou eu deixo pro próximo mês, ou arrumo uma solução mais em conta ou simplesmente adio. Nos meses seguintes até a próxima viagem tenho tempo para "economizar" no cartão e juntar mais para o próximo destino. Tipo, viagens faz parte do meu orçamento e planejamento financeiro a longo prazo.

Não sou daquelas que guarda dinheiro pensando em comprar uma casa ou um apartamento,
ou fazer pé de meia pra quando voltar pro Brasil. Primeiro, não tenho planos concretos de voltar pro Brasil. Talvez um dia. Comprar um imóvel também está out. Não vejo razão de "economizar" no aluguel daqui a uns anos e enquanto isso pagar horrores por um espaço que mesmo que seja muito aproveitado e muito bom e seu, na minha opinião, não corresponde ao respectivo esforço e custo/benefício. Prefiro mil vezes aumentar meu orçamento com aluguel e ter suaves parcelas ao longo dos anos e poder aproveitar mais da vida, vulgo: viagens mesmo, e ainda ter a liberdade de me mudar pra onde eu quiser, a hora que eu quiser. Acho questão de opinião, preferência e responsabilidade.

Mas ne, acho que sou assim pelo meu histórico, por já ter me mudado muito na vida, por já ter passado por muita coisa e ter vivido a vida me jogando pra lá e pra cá. Talvez se eu sempre tivesse morado num canto só a minha vida toda e com uma família sossegada, tivesse outra cabeça. Mas desde cedo minha vida não é assim entao to satisfeita com a cabeça que eu formei e com o estilo de vida que eu tenho.

Se eu estivesse no Brasil, talvez até conseguisse também me sustentar completamente como aqui, se tivesse um emprego tão bom quanto o que eu tenho aqui. Talvez não tivesse acesso a produtos de qualidade como tenho aqui sem ter que pagar o triplo do que eles valem, e claro, não teria chance de viajar tanto, nem conhecer tanto do que conheço. Sinto que aqui a diferença social é menor, e mesmo eu nao tendo o melhor dos trabalhos porque ne, tenho que trabalhar de fato, tenho aqui muitas vantagens que facilitam minha vida, meu estilo de vida, que possibilitam ter a vida que eu busquei.

As viagens só são possíveis porque moro no centro da Europa, há promoções de passagens, há milhas, há baixas temporadas, há flexibilidade, há opções. Há alguns detalhes que me ajudam na minha organização como por exempo, eu trabalho 4 dias na semana (32 horas), de segunda a quinta, e ganho o proporcional a isso claro, desde que Edi nasceu e eu voltei de licença maternidade. Tive que escolher entre ganhar um pouco menos e ter mais um dia pra ficar com meu filho. Se estivesse no Brasil, dificilmente no campo que trabalho, eu teria essa oportunidade. Pelo trabalho, ganho também o passe de trem anual para andar pela Suíça inteira, ou seja, não gasto um tostão pra andar de trem, de onibus, de tram, pela Suíça inteira, já é também uma boa economia que faço não só no dia a dia, mas nos passeios.

Além da flexibilidade que tenho no trabalho com relação a horários e banco de horas extras que podem ser compensadas, não consigo pensar em mais nada. Acho que é isso aí os fatores que influenciam minha vida e organização financeira no momento. Não tem fórmula nem mistério nem segredos, é apenas uma vida normal justa e honrada pelo trabalho, da qual eu prezo muito e tenho muito orgulho de ter batalhado e conseguido chegar aonde estou. E não deveria ser assim pra todo mundo? Espero ter esclarecido as duvidas de quem veio até a mim sobre esse assunto, e peço perdão aos que estão decepcionados e esperavam uma fórmula mágica hehehe...

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