Bucareste

A capital da Romênia é também a maior cidade do país, com pouco menos de 2 milhões de habitantes. E dessa vez vou começar o post logo pela minha opinião. A impressão que eu tive de Bucareste é que é uma cidade meio que "planejada" para impressionar, porém ainda que impressionante, um tanto quanto peculiar. Uma mistura de cenários socialistas como que encontrei em Kiev com algo como sei lá, algo menos leste europeu e mais energético, tipo Madri. Acho que é ali onde o socialismo encontrou o capitalismo, ou o ocidente encontra o leste.
O que foi um dia a cidade rica capital da antiga Valáquia, com arquitetura única e cultura tradicional romena só é possível constatar em poucos resquícios em cantos e esquinas da capital. A lembrança do socialismo é inevitável ao andar pelo centro de Bucareste. Conheci a história dos principais pontos que visitei e vi e senti de perto a emoção de quem viveu isso me contar lá ao vivo, com a guia Cristina Iosif, que falei no post passado.
Bem, para dar um pouco de contexto histórico, deixa eu contar que entre a Primeira e Segunda Guerras Mundiais, Bucareste cresceu muito e viveu uma era de ouro cultural e economicamente falando. Era conhecida como a "Paris do Leste", embora tenha sido palco ainda de muitos conflitos durante a Guerra Fria. Alguns terremotos destruíram parte do centro histórico da capital romena, mas contra os efeitos da natureza nada podemos fazer. O que dói mesmo na lembrança dos romenos é a destruição comandada pelo líder comunista Nicolae Ceausescu, que botou construções históricas abaixo para levantar uma Bucareste forçada a preço que a população prefereria não ter pago. Essa foto abaixo é de uma construção bem preservada que hoje é um restaurante mas é um dos poucos prédios que mostra um pouco de como era a antiga Bucareste, antes de ser mudada pelo governo comunista. Era antes uma espécie de pensão, onde dormiam os trabalhadores que vinham pra cidade trabalhar. Já dá pra notar bem a diferença das fotos seguintes...
Cristina nos contou que o ditador mudou o país a duro custo. Nas décadas de 70 e 80 quando esteve no poder, Ceausescu se focou a impor um governo evoluindo para uma ditadura. Se negou a fazer reformas trabalhistas, passou a controlar a liberdade de expressão e meios de comunicação, sem tolerar qualquer tipo de oposição. Acelerou a industrialização de Bucareste com trabalho forçado da população, que se acabava de fome e não tinha outra saída a não ser obedecer. O aumento da fome veio pelo aumento da exportação da produção agrícola do país para pagar dívidas externas, também consequência de atitudes inconsequentes do ditador.
A vida dos romenos na década de 80 foi uma luta diária pela sobrevivência. Cristina nos contou que ela e sua família sentem raiva de andar pela cidade hoje e ver os monumentos lá de pé, pois eles sabem o que tiveram que passar para que fossem construídos. Bucareste sofreu enormes alterações do que era originalmente, muita gente fugiu do país, muita gente morreu nessa transição. 
Esse edifício do Parlamento da foto acima, enooorme e muito impressionante de perto, é o 2o maior edifício do mundo, só perde para o Pentágono, nos EUA. Tanta grandiosidade e obssessão por ela, conspirações e insatisfação gradativa da população levaram a alguns golpes ao regime de Ceausescu, que teve seu governo enfraquecido, até finalmente levado às manifestações que culminou na revolução em dezembro de 1989. Revolução que aconteceu exatamente aí nessa praça da foto abaixo, no campus universitário.
Foi o único protesto violento contra o comunismo. Até tinha começado pacífico mas logo se tornou intenso quando tropas militares começaram a disparar contra os manifestantes, bem na frente do prédio da universidade de Bucareste, coração da cidade. Ficamos nós ali paradas ouvindo a história detalhada de Cristina, era como se víssemos tudo num filme, e ainda estando lá no cenário onde tudo aconteceu. 
Ceausescu fez um discurso na praça principal de Bucareste em 21 de dezembro de 1989, o que viria a ser sua última aparição pública. O evento foi grandioso, havia 80 mil pessoas na praça, foi transmitido ao vivo pela televisão, inclusive internacionalmente. Porem muitas promessas de mudanças não foram mais suficientes para a população naquele ponto. Já era tarde demais. No dia seguinte o presidente fugiu do país de helicoptero com a esposa, o piloto porem no meio da viagem alegou falhas mecânicas, fez um pouso de emergência e ao pousar, Ceausescu e sua esposa foram presos e condenados à morte. No Natal de 1989 então, foram fuzilados num pátio de uma base militar, e assim é o fim do regime comunista na Romênia, o único país que teve uma história violenta para contar sua transição de regimes.
Triste. Depois daí ocorreram eleições presidenciais e a década de 90 trouxe novos ares para Bucareste e para a Romênia.

Bucareste é a cidade mais desenvolvida da Romênia. Passamos o dia inteiro zanzando pra lá e pra cá, conhecendo os cantos mais interessantes, batendo foto, sem pressa e fugindo de uma chuva que não sabia se ia nem vinha. E no centro antigo além de igrejas ortodoxas históricas, como a Stavropoleos que é decorada com um lindo altar e frescos e também é um monastério, e ruas de paralelepípedos boas de bater perna, fomos surpreendidos com o Caru cu Bere, uma cervejaria histórica, com uma decoração interior singular, música ao vivo com piano e violino, praticamente uma volta ao passado, uma coisa impressionante e hoje já muito turística.

É tranquilo andar por Bucareste. Pelo menos no centro, apesar de alguns pedintes, não oferece perigo nas ruas, como pode ser a dúvida de alguém aí que queira visitar o leste europeu mais "leste" e tá sem coragem. Há vários parques enormes com muito verde, como o Cismigiu, que ficava perto do nosso hotel, até com um parquinho que Edi amou, obviamente. Enfim, foi bem tranquilo, em relação à segurança da viagem.
Foi legal também porque foi a primeira viagem que fiz com Edi "solto", assim andando pra lá e pra cá com a gente a maior parte do tempo, participando e aprendendo a viajar. Foi incrível conhecer mais de perto a história da Romênia, foi como que uma aula presencial de história, um intensivo. Mesmo tendo pesquisado pontos turísticos, estudado e lido antes sobre a história do país, de Bucareste, o que visitar lá e tal, só indo lá mesmo para de fato entender o que aconteceu, vendo e pisando nos cantos, vendo com seus próprios olhos. Porque a maioria dos blogs de viagem, dos guias e do foco mesmo das viagens à Romênia é todo aquele contexto com o Drácula na Transilvânia, as lendas e tudo mais. 
Eu tinha que fazer um post só sobre Bucareste e chamar atenção à história que tá contada por lá porque foi demais, demais. E ainda com uma guia como a que tivemos contando tudo ao vivo, fez toda a diferença. Foi muito legal, adorei conhecer Bucareste. Mas, claro, não podia deixar de conhecer também a história afinal do Drácula, das lendas, da Transilvânia, que é o que torna a Romênia mais famosa hoje em dia. Mas isso é assunto só pro próximo post!

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